domingo, 1 de maio de 2011

Mandando o ódio para escanteio


Por ser estreita a senda – eu não declino,
Nem por pesada a mão que o mundo espalma;
Eu sou dono e senhor de meu destino;
Eu sou o comandante de minha alma.


Por Sérgio Siscaro

Superar obstáculos insuperáveis já é difícil o suficiente; mas quão árduo é, após ter vencido a batalha e derrotado os inimigos, oferecer a mão como sinal de amizade e esquecer o passado cruel e doloroso? Esse é o tema de Invictus/Invictus (2009), filme de Clint Eastwood que explora os primeiros anos do governo de Nelson Mandela na África do Sul usando um prisma diferente: o do esporte.

Baseado no livro Playing the Enemy: Nelson Mandela and the Game That Changed a Nation, de John Carlin (lançado em 2008), a história conta como Mandela (vivido pelo bom e velho Morgan Freeman) investiu para que a seleção nacional de rugby - esporte admirado pela minoria branca do país, e visto por muitos sul-africanos como um símbolo dos anos de apartheid - pudesse unir o povo do país, independentemente de cor, e sinalizar um novo futuro. Na liderança da equipe, o capitão François Pienaar (Matt Damon), que acaba se convencendo de que ganhar as partidas significa algo muito maior do que simplesmente derrotar o adversário de campo.

É claro que o filme usa algumas surradas convenções do cinema norte-americano. Apresenta um líder quase santo (apesar do contraste oferecido pelos problemas familiares de Mandela), que busca liderar seu povo rumo a um futuro melhor, sem ódio no coração nem malícia na alma. Também a velha história de superação está presente, no desafio que o time tem de não fazer feio na copa mundial de rugby de 1995 (realizada adivinhe onde? África do Sul!). No final, temos a antiquíssima metáfora do esporte como forma de se superar os conflitos sociais e unir a sociedade em torno de uma causa comum.

Apesar disso, o roteiro não deixa de lado a dor do personagem Mandela - numa ótima atuação de Freeman. O poema do escritor vitoriano William Ernest Henley (1849–1903) que dá nome ao livro e ao filme é declamado em uma cena na qual o capitão do time visita a velha cela do seu atual presidente. Os próprios dramas familiares de Mandela podem dar outra leitura à história -- após ter fracassado com sua família biológica, o presidente não queria falhar com sua família cívica, a nação. Claro que há um pouco de pieguice, mas não chega a comprometer a linha principal do filme: é possível perdoar após tanto mal ter sido feito por tanto tempo?

Essa própria obsessão de Mandela de virar a página se transforma em empenho para que a seleção de rugby avance - e para isso o líder aprende as regras desses bizarro esporte, decora os nomes de cada jogador e faz o time dar aulas na periferia. Tudo para unir essa segunda família, e redimir o presidente. Bafana, bafana!

Para aproximar mais a temática ódio x perdão do espectador, um recurso interessante é usado por Eastwood: a rivalidade entre os seguranças do presidente, que reúnem tanto velhos associados de Mandela dos tempos do Congresso Nacional Africano (CNA) quanto ex-assessores do regime anterior. Convivência complicada, para dizer o mínimo...

Uma nota final: o mesmo poema Invictus que inspira o santo Mandela e o capitão Pienaar no filme é aquele que, na vida real, foi recitado pelo diabólico Timothy McVeigh, responsável por atentados terroristas em Oklahoma (EUA) nos anos 90, no dia de sua execução.

Ficha técnica:

Título original: Invictus
Origem: EUA
Direção: Clint Eastwood
Elenco: Morgan Freeman , Matt Damon , Tony Kgoroge , Patrick Mofokeng , Matt Stern
Roteiro: Anthony Peckham, baseado em livro de John Carlin
Ano: 2009
Duração: 2h13min


Um comentário:

  1. Gostei do filme. Mas gostei mais ainda do livro, que é de primeira. Morgan Freeman sempre manda bem, como neste.

    Sou fã de filmes de esporte. Ainda mais com uma questão como essa do Mandela.

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