segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Renascido das trevas


Não está morto o que pode eternamente jazer
E, após eras estranhas, até mesmo a morte pode morrer.
Necronomicon


O horror, o horror...

Por Sérgio Siscaro


A obra de terror do norte-americano H.P. Lovecraft (1890-1937) é uma das mais mal-adaptadas para o cinema. Apesar de influenciar centenas de filmes nos últimos 50 anos (ou mais), o horror cósmico do escritor de Providence – repleto de criaturas inomináveis, cultos apocalípticos e dimensões inescrutáveis – raras vezes foi transposto com sucesso ao cinema. Um dos fatores que levou a isso foi, certamente, o excesso de pastiches, que saturou o gênero e o transformou ora em comédia, ora em gore movie, já na década de 1980. Exceções são as produções de Dan O’Bannon, O Filho das Trevas (ou Renascido das Trevas/The Ressurrected, 1992) e de Stuart Gordon, Dagon (Dagon, 2001) – sendo que este último não é uma adaptação fiel de uma história específica, mas de elementos de vários contos lovecraftianos.

Vestido para matar... criaturas antediluvianas!

Dentro da vertente de comédia, uma surpresa recente bem interessante é O Último Lovecraft: A Relíquia de Cthulhu (The Last Lovecraft: Relic of Cthulhu, 2009), dirigido por Henry Saine. Como o próprio título já deixa entrever, é uma tiração de sarro com os elementos que, na época em que Lovecraft publicava seus contos em revistas como a Weird Tales, eram levados a sério. Usar essas histórias para comédia não é algo novo – o próprio Stuart Gordon fez vários, como Re-animator (Re-animator, 1985) e Do Além (From Beyond, 1986). A diferença é que antes tratavam-se de adaptações que descambavam para a comédia. Agora, trata-se de satirizar o universo de Lovecraft por atacado – de forma semelhante ao que foi feito com relação à franquia Jornada nas Estrelas no filme Heróis Fora de Órbita (Galaxy Quest, 1999). 

O roteiro d’O Último Lovecraft parte da premissa que os mitos de Cthulhu eram reais, e estão prestes a desabar sobre um mundo indefeso. Para defendê-lo, uma trinca de nerds (“liderada” por um descendente do escritor, que seria imune aos comandos hipnóticos dos seres abissais) roda os EUA em busca de um aliado na luta contra as hordas vindas de éons esquecidos... e fogem dos seres que querem unir dois pedaços de um amuleto (claro!) e, dessa forma, libertar Cthulhu da cidade submersa de R’lieh... Há inclusive sequências animadas dando uma geral na mitologia lovecraftiana... de forma bem, digamos, anti-lovecraftiana!


Olha o Cthulhão aí, gente!
O filme é independente, e razoavelmente bem-feito; é claro que as fantasias e maquiagens são absolutamente execráveis, mas sua função (imagino), é somar um efeito cômico a um roteiro já absurdo por definição, e tornado pior pela disposição do roteirista (que também interpreta um dos impávidos protagonistas) em tirar uma dos Mitos de Cthulhu. E consegue!

Uma advertência: o filme é para iniciados – ou seja, tem graça se o espectador conhecer o objeto da gozação. Se não, restam as piadas em cima de uma trinca de nerds, o que não é muito original... 

Ficha técnica

Título original: The Last Lovecraft: Relic of Cthulhu
Ano: 2009
Direção: Henry Saine
Elenco: Kyle Davis (Jeff), Devin McGinn (Charlie), Barak Hardley (Paul), Gregg Lawrence (Captain Olaf), Ethan Wilde (Starspawn)
Duração: 1h18min